Recebi
uma pergunta sobre esse interessante tema:
Pergunta:
“José, você sabe alguma coisa sobre Lilith? O que achei, muito por cima, é que
ela foi a primeira mulher antes de Eva, mas que não aceitou ser submissa a Adão
e, imagino que por isso, foi considerada como algo ruim, um demônio ou uma
Deusa de coisas ruins. Você tem algum conhecimento sobre esse assunto?” (Carla)
Lilith
está presente na mitologia hebraica, sendo por vezes interpretada como a
serpente que tentou Eva a comer o fruto proibido e por outras vezes
compreendida como a primeira mulher que foi criada junto com Adão e o abandonou
por não sujeitar-se a seus caprichos. Sua citação mais antiga está no livro
"O Alfabeto de Ben Sirach" ou "Alfabeto Siracida", do mesmo
autor do livro bíblico de Eclesiástico, Ben Sirach (filho de Sirach) ou em
grego Sirácida, que aparece no livro como um homem que contou ao rei
Nabucodonosor 22 histórias, associadas a 22 conhecidos provérbios hebraicos.
Dentre
essas histórias, Ben Sirach fala sobre Lilith:
“Logo
após o jovem filho do rei ficar doente, falou Nabucodonosor, "Cure meu
filho. Se você não fizer, eu o matarei." Ben Sirach imediatamente
sentou-se escreveu um amuleto com o Nome Sagrado, e nele inscreveu os anjos
encarregados da medicina por seus nomes, formas e imagens, e por seus flancos,
mãos, e pés. Nabucodonosor olhou para o amuleto (e perguntou) "O que é
isto?" (Ben Sirach respondeu:)
"Os anjos que são encarregados da medicina: Snvi, Snsvi, e Smnglof
[Pronuncia-se Sanvi, Sansavi e Semengalef ]. Depois que Deus criou Adão, que
estava só, Ele disse, 'não é bom para o homem estar só' (Gen. 2:18). Então Ele
criou a mulher para Adão, da terra, assim como Ele havia criado o próprio Adão,
e chamou-a Lilith. Adão e Lilith começaram a brigar. Ela disse, 'Eu não vou
deitar por baixo,' e ele disse, 'Eu não vou deitar por baixo de você, mas
apenas acima. Para você é adequado apenas estar na posição inferior, portanto
apenas eu estarei na superior.' Lilith respondeu, 'Nós somos reciprocamente
iguais tanto que ambos fomos criados da terra.' Mas eles não ouviam um ao
outro. Quando Lilith disse isso, pronunciou o Nome Inefável (YHWH) e voou para
longe no ar. Adão ficou em prantos depois (falou a) seu Criador: 'Soberano do
universo!' disse ele, 'a mulher que você deu-me foi embora.' De uma vez, o
Santo Senhor, bendito seja Ele, enviou estes três anjos para traze-la de volta.
"Disse o Santo Senhor para Adão, 'Se ela concordar voltar, (está tudo)
bem. Se não ela deve permitir que uma centena de suas crianças morram todos os
dias.” Os anjos deixam Deus e seguiram Lilith, a quem eles pegaram no meio do
mar, nas poderosas águas nas quais os Egípcios estavam destinados a afogarem-se.
Eles falaram-na as palavras de Deus, mas ela não queria retornar. Os anjos
disseram, 'Nós iremos afogar você no mar.' "Deixem-me!!' ela disse. 'Eu
fui criada apenas para causar doenças às crianças. Se a criança é macho, eu
tenho domínio sobre ele por oito dias depois de seu nascimento, e se fêmea, por
vinte dias.' "Quando os anjos ouviram as palavras de Lilith eles
insistiram que ela voltasse. Mas ela jurou à eles pelo nome do Deus vivo e
eterno: 'Sempre que eu ver vocês ou seus nomes ou suas formas em um amuleto, eu
não terei poder sobre esta criança.' Ela também concordou ter uma centena de
suas crianças mortas todo dia. De acordo (com isto), todo dia uma centena de
demônios pereciam, e pela mesma razão, nós escrevemos os nomes dos anjos nos amuletos
de jovens crianças. Quando Lilith vê seus nomes, ela lembra-se de seu
juramento, e a criança estabelece-se." (Alfabeto de Ben Sirach Questão 5
(23a-b)
Vamos
tentar compreender então os simbolismos contidos nesse relato e também sobre o
que diz a Gênese, fugindo do lugar comum de tratar Lilith como um demônio ou
algo do gênero, compreendendo o significado de Adão, Eva e a serpente:
"E
chamou Adam sua mulher Chava, porque foi mãe de todos os seres viventes"
(Gn 3:20)
A
criação do homem e da mulher (obviamente simbolismos) é descrita no primeiro
capítulo da Gênesis:
"E
criou Elohim o Adam a sua imagem. Criou-se a imagem de Elohim, macho e fêmeas
os criou " (Gn 1:27)
Adam
vem de Adamá que quer dizer em hebraico "filho da terra"
Chava
quer dizer em hebraico "aquela que dá vida"
Sendo
Deus espírito (Deus é espírito e seus adoradores devem adorá-lo em espírito e
em verdade - João 4:24) e sendo o espírito o princípio vital inteligente,
podemos compreender Adão (Adam) e Eva (Chava) como as polaridades, masculina e
feminina, existentes em cada espírito criado por Deus.
Adão
e Eva simbolizam, portanto, as duas polaridades do espírito, a inteligência
vital. Essa inteligência vital no seu processo evolutivo desenvolve o
intelecto, isso é que permite o espírito sair do estágio de animal racional e
evoluir para humano racional, ao despertar a razão, a capacidade de exercer o
livre arbítrio através do raciocínio. Essa capacidade (intelecto) presente nas
duas polaridades do espírito é representada
figurativamente na Gênesis como a serpente.
No recente post do blog
sobre a iniciação de Jesus eu expliquei o significado da serpente, inclusive da
passagem na qual Jesus diz que devemos ser simples como as pombas e atentos
(astutos) como as serpentes. Esse texto pode ser visto aqui: A iniciação
Portanto,
quando o espírito vivencia sua primeira encarnação no seio da humanidade e
começa a utilizar seu livre arbítrio, ele passa a "ouvir" o seu
intelecto, questionando sua essência divina e exercendo escolhas, que no
início, devido a sua inexperiência, são normalmente contrárias à sua essência
divina, fazendo com que ele necessite de inúmeras reencarnações (nascer,
morrer, nascer de novo) até que alinhe seu livre arbítrio com a essência
divina, o sopro da vida que o sustenta e o impulsiona para a evolução moral e
intelectual, sem, entretanto se sobrepor ao livre arbítrio, por isso a jornada
evolutiva tão longa e gradual. A Gênesis mostra essa jornada de forma
alegórica:
"E
Elohim trouxe sono sobre Adam (o filho da terra) que adormeceu. Pegou uma das
costelas e no lugar dela encheu de carne, da costela que tirou de Adam criou a
mulher (aquela que dá a vida) e trouxe para Adam" (Gn 2:21-22)
Essa
passagem é uma alegoria sobre o nascimento físico do espírito na humanidade. Se
em Gn 1:27 temos simbolizado o nascimento espiritual, em Gn 2:21-22 temos o
nascimento físico. A analogia é simples, ainda que de certa forma perturbadora
no sentido de entendermos como que o povo da época sabia de tais conhecimentos:
O
corpo humano possui 24 costelas. Se tirarmos uma delas, ficamos com 23. O
genoma humano é a sequência completa de DNA de um conjunto de cromossomos,
sendo que tanto o pai quanto a mãe transmitem exatamente cada um 23 cromossomos
ao filho. Dos 23 pares de cromossomos que cada ser humano possui, apenas um par
(alossomo) define o sexo do bebê, sendo que os demais 22 pares não correspondem
ao sexo, fazendo parte do patrimônio genético humano. Ou seja, o que a Gênesis
está dizendo, de forma figurativa, é que Deus criou o ser humano a partir de 23
costelas, que na realidade representam os 23 pares de cromossomos presentes em
cada ser humano.
Tal
representação na cultura hebraica e em outras culturas ainda mais antigas,
associando o espírito à manifestação física, existe em diversos símbolos cheios
de significados, mas que também mostravam um conhecimento superior,
literalmente da genética humana, como por exemplo, o símbolo do caduceu
semelhante a uma cadeia de DNA ou ainda a Árvore das Vidas (alguém aí lembrou
que no começo Adam e Chava estavam no meio de várias árvores?), pois se
considerarmos que a identidade da espécie humana contém 22 pares de cromossomos
(os pares seriam as duas serpentes se elevando no caduceu?) sendo um 23º par
responsável pela característica sexual (as duas asas no topo representando a
polaridade dupla do espírito e seu poder de escolha de manifestação dessa
polaridade, a manifestação do Ain Soph), podemos associar claramente esses 22
pares aos 22 caminhos da Árvore das Vidas, que somados as 11 esferas da Árvore
equivalem as 33 vértebras da coluna vertebral, colocando assim a Árvore das
Vidas em uma representação microcósmica como uma "coluna humana" por
onde "fluem" em seus 22 caminhos a identidade humana (22 cromossomos)
que se manifestam em sua totalidade quando percorrem toda a Árvore para
renascer como homem e mulher, manifestando plenamente as duas polaridades do espírito,
as duas serpentes do caduceu (interligadas como os pares de cromossomos) que se
encontram no topo da Árvore e em Ain Soph, acima da Árvore, manifestam de forma
completa o potencial divino no ser humano.
Da mesma maneira, em uma
representação macrocósmica, a Árvore das Vidas representa através de suas 11
esferas as dimensões do Universo, como tem sido estudado recentemente pelos
cientistas através da Teoria M.
A
manifestação simbólica desse 23º par de cromossomos (que representa as duas
asas do caduceu, essas duas asas sobre Ain Soph) acontece dentro da Árvore
exatamente através de Daat, a esfera (sephirot) oculta (ou seria o fruto
oferecido pela serpente a Adam e Chava que “desapareceu” da Árvore?). Tal
esfera representa exatamente o saber, o conhecimento (ah por isso que se chama
Árvore do conhecimento do bem e do mal) que está na intercessão de dois dos
quatros planos (atziluth e beriyah)
Lilith
representa, portanto esse fluxo vital que alguns denominam como kundalini, a
energia sexual/vital que permite a manifestação do nascimento humano através da união
das manifestações das suas duas polaridades, masculina (Adam) e feminina (Chava), a energia que
percorre toda a coluna na forma de uma serpente e que deve estar sob o controle
do intelecto e não dos instintos, para que sirva de plena manifestação positiva
dos sentimentos.
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